Retroatividade da Lei mais benéfica – Precedentes Administrativos e Judiciais

O Direito Penal traz que: “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”.

Os Tribunais já se manifestaram ser plenamente possível a aplicação de uma lei mais benéfica, no âmbito do Direito Administrativo.

Vejamos o que diz direito penal:

No caput do art. 2º do Código Penal Brasileiro , a abolitio criminis é assim definida:
“Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.” Isso significa que, quando uma lei deixa de considerar crime algo que antes assim o era, cessam os efeitos dessa lei, abrangendo também o caso já julgado. Esse é o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, definido na Constituição Federal :”a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
Em face do princípio ” Tempus regit actum ” (o tempo rege o ato), observado em nossa legislação, a hipótese da abolitio criminis será aplicada, portanto, como exceção, visto que a punibilidade será considerada extinta pelo fato de lei nova retroagir em benefício do réu. É o que está
definido no Código Penal: Extingue-se a punibilidade (…) pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Abolitio_criminis

ASSIM prevê o Direito Penal:

PARTE GERAL
TÍTULO I
DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Art. 1º – Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Lei penal no tempo

Art. 2º – Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único – A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

É plenamente possível aplicarmos essa teoria, do Direito Penal, ao processo administrativo, pois a penalidade administrativa também é sancionatória e quando existe lei nova que beneficia o administrado, a Lei deve retroagir para beneficiá-lo.
ASSIM prevê a CF/88 em artigo 5º, inciso XL:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XL – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

Por exemplo, ocorreu alteração no artigo 244, inciso I do CTB, no ano de 2013.
Quem conduzia moto com viseira levantada, a punição para tal conduta era a Suspensão do
Direito de Dirigir.

A conduta referente a viseira levantada, passou a ter classificação “leve”, apenas 03 pontos na CNH.

Ou seja, a partir de tal autuação, quem um dia foi suspenso e/ou cassado, com base em tal conduta, passou a ter o direito a invocar a retroatividade da lei mais benéfica, pois a conduta pela qual o mesmo estava sendo punido não era mais classificada como punitiva na legislação alterada.

1ª JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS DE INFRAÇÕES 

Protocolo: 116100.14120002490.. de 03/01/2014
Requerente: ANDERSON P.
Auto de infração: 276670T00067162
Notificação de Suspensão: 6163882

        … 

        O veículo do recorrente uma motocicleta HONDA CG/150 – ANH 332.., autuada no dia 21/10/2014, no art. 244, inciso I, pela conduta de supostamente seu condutor ter transitado com a viseira do capacete levantada e sem óculos de proteção, conforme o AIT 276670T000067162. 

        Ocorre que na data em que o recorrente foi autuado a infração era de natureza GRAVÍSSIMA, com penalidade MULTA e SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR.        Em 01/10/2013 entrou em vigor a Resolução 453/13 do CONTRAN que prevê no inciso II do art. 4° “utilizando viseira ou óculos de proteção em descumprimento ao disposto no art. 3° ou utilizando capacete não fixado n cabeça conforme art. 1°: art. 169do CTB, ou seja, na presente data da conduta praticada pelo recorrente que à época foi tipificada no inciso I do art. 244, hoje se trata de uma infração de natureza LEVE, somente com penalidade de MULTA e não mais com suspensão do direito de dirigir.

E também,

2ª JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS DE INFRAÇÕES 

Protocolo: 116100.1412000345454…
Requerente: CARLOS R.
Auto de infração: 276670 – T00079588

        Com a entrada em vigor da Resolução n.° 453 de 26/09/2013, houve uma mudança em relação as sanções por descumprimento das exigências estabelecidas no art. 244, I e II. De acordo com o novo texto de mencionada Resolução, dirigir ou conduzir passageiro em descumprimento às exigências quanto a viseira ou óculos de proteção, objeto da presente infração, acarretará a aplicação da sanção prevista no art. 169 do CTB. Vejamos o dispositivo: 

Art. 3º O condutor e o passageiro de motocicleta, motoneta, ciclomotor, triciclo motorizado e quadriciclo motorizado, para circular na via pública, deverão utilizar capacete com viseira, ou na ausência desta, óculos de proteção, em boas condições de uso.

§ 1º Entende-se por óculos de proteção, aquele que permite ao usuário a utilização simultânea de óculos corretivos ou de sol.

§ 2º Fica proibido o uso de óculos de sol, óculos corretivos ou de segurança do trabalho (EPI) de forma singular, em substituição aos óculos de proteção.

§ 3º Quando o veículo estiver em circulação, a viseira ou óculos de proteção deverão estar posicionados de forma a dar proteção total aos olhos, observados os seguintes critérios:

I – quando o veículo estiver imobilizado na via, independentemente do motivo, a viseira poderá ser totalmente levantada, devendo ser imediatamente restabelecida a posição frontal aos olhos quando o veículo for colocado em movimento;

II – a viseira deverá estar abaixada de tal forma possibilite a proteção total frontal aos olhos, considerando-se um plano horizontal, permitindo-se, no caso dos capacetes com queixeira, pequena abertura de forma a garantir a circulação de ar;

III – no caso dos capacetes modulares, além da viseira, conforme inciso II, a queixeira deverá estar totalmente abaixada e travada.

§ 4º No período noturno, é obrigatório o uso de viseira no padrão cristal.

§ 5º É proibida a aposição de película na viseira do capacete e nos óculos de proteção.

Art. 4º Dirigir ou conduzir passageiro em descumprimento às disposições contidas nesta Resolução implicará nas sanções previstas no CTB, conforme abaixo:

I – com o capacete fora das especificações contidas no art. 2º, exceto inciso II, combinado com o Anexo: Art. 230, inciso X, do CTB;

II – utilizando viseira ou óculos de proteção em descumprimento ao disposto no art. 3º ou utilizando capacete não afixado na cabeça conforme art. 1º: Art. 169 do CTB;

III – não uso de capacete motociclístico, capacete não encaixado na cabeça ou uso de capacete indevido, conforme Anexo: incisos I ou II do art. 244 do CTB, conforme o caso.

        Neste sentido, ainda que o presente AIT tenha sido lavrado em data anterior a entrada em vigor da Resolução 453/2013, não há como negar provimento ao presente recurso (ex officio), visto que o mesmo está sendo julgado já na vigência do novo texto da referida Resolução, cujo posicionamento em relação a sanção aplicada, foi alterado para beneficiar o condutor infrator. Portanto, melhor sorte assiste ao Recorrente no presente recurso, pois que é merecedor de prosperar. 

        Diante do exposto, recebo o presente recurso, visto que tempestivo e revestido dos elementos exigidos a sua admissibilidade e, no mérito, nos termos da fundamentação e legislação ora apresentadas, Dou Provimento, arquivando-o. 

O poder Judiciário também se manifestou sobre o tema: Acórdão – Relator:

Renata Ribeiro Bau, Data de Julgamento: 10/05/2017, 4ª Turma Recursal:

RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA. TRÂNSITO. SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. CONDUÇÃO DE MOTOCICLETA SEM UTILIZAÇÃO DE CINTA JUGULAR. INFRAÇÃO CONSIDERADA GRAVÍSSIMA À ÉPOCA DOS FATOS. RESOLUÇÃO QUE TORNOU A INFRAÇÃO COMETIDA DE
NATUREZA LEVE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA. ART.

5º, LX, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, TAMBÉM APLICÁVEL ÀS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS. NULIDADE DOS PROCEDIMENTOS DE SUSPENSÃO E CASSAÇÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-PR – RI: 00493970…1681600140 PR Relator: Renata Ribeiro Bau, Data de Julgamento: 10/05/2017, 4ª Turma Recursal – DM92, Data de Publicação: 11/05/2017)

Podemos então concluir que sempre que a Legislação é alterada e a penalidade pela qual alguém está sendo punido não mais se enquadra, deve ser cancelado e arquivado o processo administrativo.

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